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Convênio de município para contratar presos não configura transferência voluntária

Os municípios podem contratar a prestação de serviços de presidiários por meio de convênio com a Secretaria de Estado da Segurança Pública do Paraná (Sesp-PR). O ajuste deve detalhar adequadamente o limite de apenados a ser contratado, em observância ao artigo 36 da Lei nº 7.210/84 (Lei de Execução Penal), além das condições de execução do objeto e das obrigações de cada parte, em atendimento às disposições do artigo 116 da Lei Federal nº 8.666/93 (Lei de Licitações e Contratos) e da Lei Estadual 15.608/2007 (Lei de Licitações e Contratos do Estado do Paraná).

Também é possível que o município inclua a exigência, em editais de licitação para a contratação de serviços e de obras, de que as empresas contratadas utilizem um percentual mínimo de sua mão de obra oriundo ou egresso do sistema prisional, na forma a ser estabelecida em regulamento próprio do ente contratante.

Caso os recursos despendidos restrinjam-se aos valores referentes à remuneração do trabalho do preso e às taxas previstas em lei como devidas ao Fundo Penitenciário do Estado do Paraná (Fupen-PR), o convênio ou instrumento congênere não constitui transferência voluntária; e, portanto, não se submete ao disposto na Resolução nº 28/11 do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR). Assim, não é necessário o registro no Sistema Integrado de Transferências (SIT) do Tribunal.

No entanto, o instrumento de convênio deve respeitar as disposições legais aplicáveis - Lei nº 8.666/93, Lei nº 14.133/21 (Nova Lei de Licitações e Contratos) e Lei Estadual nº 15.608/07) -; e estará sujeito à regular fiscalização do TCE-PR, no exercício do controle externo.

As despesas com convênio para prestação de serviços de mão de obra por apenados devem ser registradas sob a classificação "3.3.90.39.00.00 - Outros Serviços de Terceiros - Pessoa Jurídica".

Essa é a nova orientação do TCE-PR, em resposta à Consulta formulada em 2020 pelo Município de Londrina, por meio da qual questionou sobre a possibilidade de formalização de parceria para operacionalizar o trabalho de apenados ao município; e por meio de qual modalidade de parceria seria o procedimento adequado.

Ao julgar Embargos de Declaração do Fupen-PR em face da resposta apresentada pelo Tribunal a essa Consulta em 2021, os conselheiros determinaram que parte da resposta expressa no Acórdão nº 2015/21 - Tribunal Pleno fosse reformada, para estabelecer que as cobranças realizadas pelo Fupen-PR não são transferências voluntárias; mas sim parcelas retributivas do trabalho do preso - salário - e taxas em razão dos serviços prestados por esse órgão.

 

Instrução do processo

Em seus pareceres, as assessorias jurídica e contábil da Prefeitura de Londrina defenderam que a atividade laboral de presos no serviço público deve ser regulada por convênio a ser celebrado entre o Estado do Paraná, por intermédio da Sesp-PR, e o município. Além disso, frisaram que a parceria deve se submeter às disposições da Lei nº 8.666/93 e às normas do TCE-PR.

A Coordenadoria de Gestão Estadual (CGE) do TCE-PR afirmou que a formalização do convênio é possível. Mas orientou que o trabalho decorrente das disposições da Lei nº 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) não é caracterizado como transferência voluntária, conforme preceitua o artigo 25 da Lei nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF); e, portanto, não se submete ao disposto na Resolução nº 28/11 do TCE-PR, que instituiu o SIT.

A unidade técnica lembrou que esse trabalho depende de classificação para vagas e homologações do Fupen-PR quanto à proposta de emprego, além do controle e avaliação da mão de obra carcerária pelo fundo, para a realização de parcerias voltadas à reinserção e remuneração do reeducando, indenização dos danos causados pelo crime, assistência à família e pequenas despesas pessoais, com ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado.

O Ministério Público de Contas (MPC-PR) acrescentou que as despesas com convênio para prestação de serviços de mão de obra por apenados devem ser registradas sob a classificação "3.3.90.39.00.00 - Outros Serviços de Terceiros - Pessoa Jurídica", conforme orientação da Secretaria do Tesouro Nacional (STN); e deve levar em conta os detalhamentos necessários ao atendimento de peculiaridades de controle indicadas no Plano de Contas do TCE-PR.

O órgão ministerial também destacou a convergência de interesses entre as partes, pois o município se beneficia da utilização da mão de obra dos presos sem a incidência de encargos trabalhistas; o Estado cumpre sua obrigação constitucional; e o preso tem oportunidade de reintegrar-se no convívio social, além de receber para indenizar o Estado e a vítima pelas despesas com sua manutenção.

 

Legislação, jurisprudência e doutrina

O parágrafo 5º do artigo 40 da Lei nº 8.666/93 dispõe que a administração pública poderá, nos editais de licitação para a contratação de serviços, exigir da contratada que um percentual mínimo de sua mão de obra seja oriundo ou egresso do sistema prisional, com a finalidade de ressocialização do reeducando, na forma estabelecida em regulamento.

O artigo 116 da Lei de Licitações e Contratos define que as disposições dessa lei federal são aplicáveis aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da administração. Seu parágrafo 1ª fixa que esses instrumentos dependem de prévia aprovação de competente plano de trabalho proposto pela organização interessada; e lista as informações mínimas desse plano.

O parágrafo 2º do artigo 116 determina que, assinado o convênio, a entidade ou órgão repassador dará ciência à assembleia legislativa ou à câmara municipal respectiva; e o seguinte, que as parcelas do convênio serão liberadas em estrita conformidade com o plano de aplicação aprovado, exceto nos casos em que ocorrer impropriedades, até o seu saneamento. Os parágrafos 4º, 5º e 6º dispõem sobre a aplicação de recursos não utilizados, as receitas desse investimento e o eventual saldo final de convênio.

O artigo 133 da Lei de Licitações e Contratos do Estado do Paraná (Lei Estadual nº 15.608/07) estabelece que o convênio é uma forma de ajuste entre o poder público e entidades públicas ou privadas, para a consecução de objetivos de interesse comum, por colaboração recíproca. Os incisos desse artigo dispõem que o convênio se distingue dos contratos pelos principais traços característicos: igualdade jurídica dos partícipes; não persecução da lucratividade; possibilidade de denúncia unilateral por qualquer dos partícipes, na forma prevista no ajuste; diversificação da cooperação oferecida por cada partícipe; responsabilidade dos partícipes limitada, exclusivamente, às obrigações contraídas durante o ajuste.

O artigo 25 da Lei de Responsabilidade Fiscal define transferência voluntária como a entrega de recursos correntes ou de capital a outro ente da federação, a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira, que não decorra de determinação constitucional, legal ou os destinados ao Sistema Único de Saúde (SUS).

O artigo 28 da Lei nº 7.210/84 fixa que o trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva. O parágrafo 2º desse artigo expressa que o trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

O artigo seguinte dispõe que o trabalho do preso será remunerado, mediante prévia tabela; e não pode ser inferior a três quartos do salário mínimo. De acordo com o seu parágrafo 1º, o produto da remuneração pelo trabalho deverá atender à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não reparados por outros meios; à assistência à família; a pequenas despesas pessoais; ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nas letras anteriores.

O artigo 35 da Lei de Execução Penal estabelece que o trabalho externo será admissível para os presos em regime fechado somente em serviço ou obras públicas realizadas por órgãos da administração direta ou indireta, ou entidades privadas, desde que tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina. Os parágrafos 1º e 2º desse artigo fixam que o limite máximo do número de presos será de 10% do total de empregados na obra; e que caberá ao órgão da administração, à entidade ou à empresa empreiteira a remuneração desse trabalho. 

O artigo 39, ainda da Lei nº 7.210/84, expressa que constituem deveres do condenado, entre outros, a indenização à vítima ou aos seus sucessores; e ao Estado, quando possível, das despesas realizadas com a sua manutenção, mediante desconto proporcional da remuneração do trabalho.

Decreto nº 9.450/18 institui a Política Nacional de Trabalho no Âmbito do Sistema Prisional, voltada à ampliação e qualificação da oferta de vagas de trabalho, ao empreendedorismo e à formação profissional das pessoas presas e egressas do sistema prisional, e regulamenta o parágrafo 5º do artigo 40 da Lei nº 8.666/93.

Os incisos XII e XIII do artigo 3º da Lei nº 4.955/64, que instituiu o Fupen-PR, gerido pelo Departamento Penitenciário do Estado do Paraná (Depen-PR), dispõem que constituem receitas desse fundo as taxas cobradas das empresas que utilizam mão de obra dos internos do sistema penitenciário e parcela da remuneração do trabalho do preso, que venha a ser legalmente definida e destinada ao Estado, a título de ressarcimento ou indenização de despesas com o mesmo preso.

O inciso V do artigo 16 da Lei Estadual nº 17.140/12 fixa que compete ao conselho diretor do Fupen-PR a deliberação sobre tarifas e tabelas relativas a serviços, produtos e operações de interesse do sistema penitenciário, oriundos das atividades produtivas e de serviços das unidades penais ou por meio de convênios, acordos ou contratos com entidades públicas ou privadas.

Instada a se manifestar pelo consulente, a STN afirmou que, na situação questionada, relativa a termo de cooperação ou qualquer outro instrumento que possui natureza similar a contratos, orienta-se que as despesas sejam realizadas na modalidade de aplicação 90 - direta -, conforme classificação por natureza de despesa orçamentária estabelecida pela Portaria Interministerial STN/SOF nº 163/2001.

 

Decisão

O relator do processo, conselheiro Fabio Camargo, endossou o entendimento anterior de que o trabalho dos apenados não está submetido à legislação celetista e tem seu fundamento constitucional no direito ao trabalho e à reinserção social, nos termos regulamentados pela Lei de Execução Penal; e que a prestação de serviços por cidadãos nessas condições deve ser acompanhada e controlada pelos órgãos públicos responsáveis pela execução penal.

Assim, Camargo considerou que o instrumento de convênio é adequado a regular as relações questionadas na consulta. Além disso, ele confirmou que o convênio deve respeitar o limite de 10% do total de empregados apenados na obra ou no serviço; e que é juridicamente adequado exigir, em editais de licitação para a contratação de serviços e de obras, que as empresas contratadas pela administração municipal utilizem um percentual mínimo de sua mão de obra oriundo ou egresso do sistema prisional.

O conselheiro afirmou que eventual convênio ou instrumento congênere firmado por entidade interessada com a Sesp-PR para prestação de serviços pelos apenados, cujos repasses financeiros envolvam somente os valores referentes à remuneração do trabalho do preso e às taxas devidas ao Fupen-PR, não se enquadra no conceito de transferência voluntária.

O relator explicou que na hipótese em análise inexiste natureza de cooperação, auxílio ou assistência financeira na despesa, visto que ela decorre diretamente das supracitadas leis, ante a necessidade de remuneração pelo trabalho exercido pelo apenado e do pagamento das taxas legalmente previstas pela utilização da mão de obra dos internos. Assim, ele entendeu que esse tipo de convênio não se enquadra da definição de transferência voluntária disposta na LRF.

Camargo frisou que, independentemente do aspecto social de reabilitação de presos, a essência do gasto público, para fins de contabilização da despesa, é a contratação da prestação de serviços de mão de obra de apenados a ser suportada pelo município. Assim, ele entendeu que é mais apropriado que a despesa seja classificada como "3.3.90.39.00.00 - Outros Serviços de Terceiros - Pessoa Jurídica", pois o pagamento ocorre de forma retributiva a um serviço prestado.

Os conselheiros aprovaram o voto do relator por unanimidade, na Sessão de Plenário Virtual nº 10/23 do Tribunal Pleno do TCE-PR, concluída em 7 de junho. O Acórdão nº 1443/23 - Tribunal Pleno foi disponibilizado em 16 de junho, na edição nº 3.001 do Diário Eletrônico do TCE-PR (DETC). O trânsito em julgado do processo ocorreu em 27 de junho.

 

Serviço

Processo :

502354/20

Acórdão nº

1443/23 - Tribunal Pleno

Assunto:

Consulta

Entidade:

Município de Londrina

Relator:

Conselheiro Fabio de Souza Camargo

 

Autor: Diretoria de Comunicação SocialFonte: TCE/PR

 
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