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Jurisprudência

"Venda de folha de pagamento" a instituição financeira deve ser licitada via pregão

A contratação de serviços de instituição financeira para gerenciamento de folha de pagamento de órgão público deve ser precedida de licitação na modalidade pregão, que é a forma adequada de se licitar bens e serviços comuns, nos termos do artigo 6°, incisos XIII e XLI, da Lei nº 14.133.21 (Lei de Licitações e Contratos).

Portanto, a concorrência não deve ser utilizada para esse fim, pois, nos termos do artigo 6°, inciso XXXVIII, da Lei nº 14.133/21, essa modalidade é direcionada à contratação de bens e serviços especiais e de obras e serviços comuns e especiais de engenharia, entre os quais a contratação de serviços de instituição financeira para gerenciamento de folha de pagamento não se enquadra.

A jurisprudência admite a adoção dos critérios "pregão negativo" ou "pregão invertido" quando for adequado ao objetivo legal da busca da proposta mais vantajosa para a administração pública. Portanto, esses critérios são viáveis para a contratação de serviços de instituição financeira para gerenciamento de folha de pagamento.

A utilização da fórmula de conversão de menor preço para maior oferta viabiliza a realização da licitação no sistema Compras.gov e a adoção do pregão presencial, quando devidamente motivado, com observância às formalidades dispostas no artigo 17 da Lei n° 14.133/21.

Esta é a orientação do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), em resposta à Consulta formulada pelo Município de Terra Roxa (Região Oeste), por meio da qual questionou sobre qual seria a forma adequada de promover a contratação de serviços de "venda de folha de pagamento" a instituição financeira.

 

Instrução do processo

A então Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) do TCE-PR afirmou que a legislação em vigor considera o objeto para a definição da modalidade de licitação, dividindo-o em comum e especial; e lembrou que a Lei nº 14.133/21 não somente fez do procedimento previsto para o pregão a regra para todas as modalidades, como tornou-o obrigatório para a contratação de bens e serviços comuns.

A CGM ressaltou que a definição do que seria bem e serviço comum é a mesma anteriormente definida na Lei n° 10520/02 (Lei do Pregão); e que a contratação de instituição financeira para gerenciamento da folha de pagamento de servidores se enquadra em serviço comum, que pode ser definido no edital com base em especificações utilizadas pelas instituições financeiras.

A unidade técnica destacou que a jurisprudência autoriza a utilização do "pregão negativo" ou "pregão invertido", que prevê como critério de julgamento a maior oferta ou o maior lance, mesmo diante da ausência de previsão expressa a respeito da adoção desses critérios. Assim, a CGM concluiu que a utilização do pregão com critério de julgamento na maior oferta não constitui utilização de critério de julgamento não previsto por lei, mas, sim, a utilização do critério legalmente estabelecido e plenamente adequado ao objeto do certame, com a utilização do instrumento legal mais especialmente pertinente para os objetivos da administração pública.

Quanto à possibilidade de o certame ser presencial, em face da impossibilidade técnica de utilização do Sistema Comprasnet, atualmente substituído pelo Compras.gov, afirmou que a sistemática não impede a utilização do pregão eletrônico nos casos em que se utiliza o "pregão negativo", sendo possível criar fórmula de conversão de menor preço para maior oferta.

O Ministério Público de Contas (MPC-PR) enfatizou que a Lei n° 14.133/21 modificou a forma de seleção da modalidade licitatória, dando ênfase à característica do objeto licitado mediante a classificação em "bens e serviços comuns" e "bens e serviços especiais"; e que, de acordo com essa lei, a modalidade pregão obrigatoriamente deve ser a adotada.

O órgão ministerial afirmou que a legislação prevê "menor preço" ou "maior desconto" como critérios de julgamentos; mas salientou que a ausência de previsão normativa específica permitiu a construção doutrinária e jurisprudencial do "pregão negativo" ou "pregão invertido".

O MPC-PR concluiu que a matéria é semelhante ao que foi debatido recentemente pelo TCE-PR quanto à possibilidade de adoção de taxas negativas em processos licitatórios envolvendo a contratação de empresas especializadas na gestão e fornecimento de auxílio-alimentação por meio de cartões ou instrumentos congêneres.

Assim, o órgão ministerial citou o Prejulgado nº 34 do TCE-PR, que expressa o entendimento de que a vedação à adoção de taxa negativa deveria se restringir aos órgãos e entidades da administração pública cujo quadro de pessoal seja formado por empregados públicos, submetidos ao regime celetista. Quanto aos demais entes que concedem tal benefício, com base em previsão estatutária, o MPC-PR frisou que não seria aplicável a restrição contida na Lei nº 4.442/22, admitindo-se a taxa de administração negativa nas respectivas licitações para este objeto.

Sobre a utilização do sistema Comprasnet - atual Compras.gov.br -, o órgão ministerial corroborou os fundamentos da CGM no sentido de que a fórmula de conversão de menor preço para maior oferta viabiliza a realização da licitação.

 

Legislação, jurisprudência e doutrina

O inciso XIII do artigo 6° da Lei nº 14.133/21 define bens e serviços comuns como aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade podem ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais de mercado.

O inciso XIV do artigo 6° da Lei de Licitações classifica bens e serviços especiais como aqueles que, por sua alta heterogeneidade ou complexidade, não podem ser descritos na forma do inciso XIII desse artigo, exigida justificativa prévia do contratante.

O inciso XXXVIII do artigo 6° da Lei nº 14.133/21 dispõe que a concorrência é modalidade de licitação adequada para contratação de bens e serviços especiais e de obras e serviços comuns e especiais de engenharia.

O inciso XLI do artigo 6° da Lei de Licitações estabelece que o pregão é modalidade de licitação obrigatória para aquisição de bens e serviços comuns, cujo critério de julgamento poderá ser o de menor preço ou o de maior desconto.

O parágrafo 2º do artigo 17 da Lei n° 14.133/21 fixa que as licitações serão realizadas preferencialmente sob a forma eletrônica, admitida a utilização da forma presencial, desde que motivada, devendo a sessão pública ser registrada em ata e gravada em áudio e vídeo.

O parágrafo 5º desse mesmo artigo expressa que, na hipótese excepcional de licitação sob a forma presencial a que refere o parágrafo 2º, a sessão pública de apresentação de propostas deverá ser gravada em áudio e vídeo; e a gravação será juntada aos autos do processo licitatório depois de seu encerramento.

O artigo 2º da Lei nº 14.442/22 dispõe que as importâncias pagas pelo empregador a título de auxílio-alimentação de que trata o parágrafo 2º do artigo 457 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) deverão ser utilizadas para o pagamento de refeições em restaurantes e estabelecimentos similares ou para a aquisição de gêneros alimentícios em estabelecimentos comerciais.

O inciso I do artigo 3º da Lei n° 14.442/22 estabelece que o empregador, ao contratar pessoa jurídica para o fornecimento do auxílio-alimentação de que trata o artigo 2º dessa lei, não poderá exigir ou receber qualquer tipo de deságio ou imposição de descontos sobre o valor contratado.

O inciso III do artigo 3º da Lei n° 14.442/22 fixa que o empregador também não poderá exigir outras verbas e benefícios diretos ou indiretos de qualquer natureza não vinculados diretamente à promoção de saúde e segurança alimentar do empregado, no âmbito de contratos firmados com empresas emissoras de instrumentos de pagamento de auxílio-alimentação.

Prejulgado nº 34 (Acórdão n° 1053/24 - Tribunal Pleno) do TCE-PR consolidou o entendimento de que a proibição estabelecida no artigo 3°, incisos I e III, da Lei n° 14.442/22 aplica-se apenas aos órgãos e entidades da administração pública cujo quadro de pessoal seja formado por empregados públicos, submetidos ao regime celetista.

Esse prejulgado dispõe que, especificamente para esses órgãos e entidades, é vedada a aceitação de taxas de administração negativas em licitações para a contratação de pessoas jurídicas para o gerenciamento e fornecimento de auxílio-alimentação por meio de cartões ou instrumentos congêneres.

De acordo com o Prejulgado 34, para os demais entes da administração pública, que concedem o auxílio-alimentação ou benefício de nomenclatura similar com base em previsão estatutária, não se aplica a restrição disposta no artigo 3°, incisos I e III, da Lei n° 14.442/22, admitindo-se a taxa de administração negativa nas respectivas licitações para este objeto.

O Acórdão nº 3337/24 - Tribunal Pleno do TCE-PR (Consulta nº 609796/23) dispõe que a vedação à aceitação de taxas de administração negativas em licitações para a contratação de pessoas jurídicas para o gerenciamento e fornecimento de auxílio-alimentação por meio de cartões ou instrumentos congêneres (artigo 3°, I e III, da Lei n° 14.442/22) aplica-se apenas aos órgãos e entidades da administração pública cujo quadro de pessoal seja formado por empregados públicos, submetidos ao regime celetista, conforme entendimento fixado pelo Prejulgado nº 34 do TCE-PR.

Portanto, aos demais entes da administração pública, que concedem o auxílio-alimentação ou benefício de nomenclatura similar com base em previsão estatutária, não se aplica a restrição do artigo 3°, I e III, da Lei n° 14.442/22, admitindo-se a taxa de administração negativa nas respectivas licitações para este objeto.

O Acórdão nº 1657/23 - Tribunal Pleno do TCE-PR (Consulta nº 7595/22) estabelece que é possível a utilização do "pregão negativo" - por maior preço - nas licitações destinadas à concessão de uso de bem público, de acordo com as disposições da Lei nº 10.520/02 e da Lei nº 14.133/2021. Essas leis não alteraram a figura do pregão por maior preço, que segue nos mesmos termos já fixados pela jurisprudência e pela doutrina.

O Acórdão nº 2605/18 - Tribunal Pleno do TCE-PR (Consulta nº 800781/17) fixa o entendimento de que o pregão eletrônico é a modalidade licitatória mais adequada para a aquisição de bens e serviços comuns; e deve ser previamente regulamentado pela legislação municipal. Mas o pregão presencial pode substituí-lo, desde que seja justificada a vantagem para a administração e sejam observados os princípios licitatórios, nos exatos termos do artigo 3º, I, da Lei nº 10.520/2002 e do artigo 50 da Lei nº 9.784/99 (Lei do Processo Administrativo).

O gestor público tem margem de discricionariedade para, ante a inviabilidade do pregão, utilizar a modalidade licitatória da concorrência para a aquisição de bens ou serviços com maior complexidade, desde que justifique adequadamente essa opção e observe os dispositivos legais correlatos.

O Acórdão nº 3042/2008 - Plenário do Tribunal de Contas da União (Consulta nº 030.658/2008-0) expressa que o direito de um ente público de contratar instituições financeiras para prestar serviços financeiros necessários à consecução de suas atividades de autoadministração e implementação de ações governamentais, como a gestão da folha de pagamentos previdenciários, pode ser considerado um ativo especial intangível e, nesta condição, pode ser ofertada sua exploração econômico-financeira ao mercado, por meio de licitação. Este bem ou direito não pode ser, no entanto, objeto de alienação.

A adoção de critério de julgamento de propostas não previsto na legislação do pregão, do tipo maior valor ofertado para o objeto mencionado no item anterior, somente seria admissível, em princípio, em caráter excepcional, tendo em vista o relevante interesse público da aplicação deste critério alternativo para o atingimento dos objetivos institucionais do ente público e como mecanismo concretizador do princípio licitatório da seleção da oferta mais vantajosa para a administração. Essa especificidade deve obrigatoriamente ser motivada e justificada pelo ente público no processo relativo ao certame, além de ter demonstrada sua viabilidade mercadológica.

O Acórdão nº 2844/10 - Plenário do TCU (Representação nº 011.355/2010-7) dispõe que a legislação sobre contratações públicas trata essencialmente dos contratos que geram dispêndios, ou seja, contratos de aquisição de bens e serviços, havendo pouca disciplina sobre os ajustes que geram receitas para a administração pública. Daí por que, em se tratando de contratos de geração de receita, a utilização da legislação em vigor não prescinde da analogia. A licitação na modalidade pregão, com critério de julgamento na maior oferta, não constitui utilização de critério de julgamento não previsto por lei, mas, sim, a utilização do critério legalmente estabelecido e plenamente adequado ao objeto do certame, com a utilização do instrumento legal mais especialmente pertinente para os objetivos da administração.

O acórdão cita que são diversas as vantagens comparativas da modalidade pregão para a administração pública em termos de proporcionar maior eficiência, transparência e competitividade.

Além disso, a decisão menciona vários precedentes na utilização do pregão para a concessão de áreas públicas por parte de diversos órgãos da administração, como os Tribunais Regionais Federais (Pregão nº 7/08, TRF da 1ª Região), o Ministério Público Federal (Pregão nº 41/07) e a Procuradoria da República no Distrito Federal (Pregão nº 1/08).

Finalmente, o acórdão expressa que a adoção do critério de julgamento pela maior oferta, em lances sucessivos, nada mais é que a adequada aplicação da lei ao caso concreto, ajustando-a à natureza do objeto do certame, restando assegurada a escolha da proposta mais vantajosa que, conjuntamente com a isonomia de todos os interessados, constituem as finalidades primeiras de todo procedimento licitatório.

O Acórdão nº 1940/15 - Plenário do TCU (Consulta nº 033.466/13) estabelece que, havendo interesse de a administração pública promover prévio procedimento licitatório para contratação de prestação de serviços, em caráter exclusivo, de pagamento de remuneração de servidores ativos, inativos e pensionistas e outros serviços similares, com a previsão de contraprestação pecuniária por parte da contratada, deverá a contratante, além de franquear acesso ao certame tanto das instituições financeiras públicas como das privadas, estimar o orçamento base da contrapartida financeira a ser paga pela futura contratada com fundamento em estudo ou avaliação de mercado; e realizar licitação na modalidade pregão, prevista na Lei 10.520/01, preferencialmente sob forma eletrônica, tendo por base critério "maior preço".

O Acórdão nº 478/16 - Plenário do TCU (Representação nº 019.436/2014-9) expressa que a jurisprudência daquele tribunal é no sentido de que a modalidade de licitação que melhor se adequa à concessão remunerada de uso de bens públicos é a realização de pregão; e que o órgão não deve se valer, indevidamente, de certames na modalidade convite para aquisição de bens e serviços comuns, por se tratar de um meio que permite viabilizar o direcionamento dos resultados nesses certames licitatórios.

O doutrinador Joel de Menezes Nieburh conceitua o "pregão invertido" ou "pregão negativo" como aquele em que a disputa alcança ou parte do preço zero, dispondo-se os licitantes a pagarem para a administração pública pela execução do contrato. Ele explica que, quando a administração deixa de pagar e passa a receber, o que interessa a ela já não é mais o menor preço, e sim o maior lance ou oferta.

 

Decisão

O relator do processo, conselheiro Durval Amaral, acompanhou o posicionamento da CGM e do MPC-PR como razão de decidir. Ele afirmou que, de acordo com a legislação de regência, em uma conjugação entre o juízo de subsunção da hipótese à norma e de exclusão, como o serviço objeto da Consulta não se trata de serviço de engenharia, resta evidente que a modalidade pregão é a adequada para o serviço de contratação de gerenciamento de folha de pagamento de servidores públicos municipais.

Quanto ao critério de julgamento, Amaral ressaltou que a legislação prevê o de "menor preço" ou de "maior desconto"; mas reconheceu que, por tratar-se de um ativo a gerar receita à administração, esses critérios não são viáveis. Ele destacou que a construção da figura do pregão por maior lance, negativo ou invertido, encontra integral suporte nas condições construídas pela sólida jurisprudência e doutrina acerca do tema que, ao longo dos anos, perfilhou conceitos, hipóteses e condicionantes para a sua correta estruturação e implementação nos casos práticos pertinentes; e, ainda que haja a omissão legislativa quanto ao "pregão negativo" - tanto no sentido de prevê-lo quanto no de vetá-lo -, esse modelo deve prevalecer, notadamente por força da segurança jurídica a ser resguardada.

O conselheiro enalteceu a adequação desse critério, tendo em vista o objetivo legal da busca da proposta mais vantajosa para a administração pública, o que contribui para conformidade legal do critério em detrimento da tese de "abrandamento da legalidade". Assim, ele concluiu que a adoção do pregão negativo ou invertido é admissível nas situações em que se mostrar condizente com as diretrizes trazidas na jurisprudência.

O relator lembrou que a preferência pela forma eletrônica é imposição do parágrafo 2º artigo 17 da Lei n° 14.133/2021; e que a forma presencial do certame deverá ser motivada em obediência das formalidades do parágrafo 5° do mesmo artigo.

Finalmente, Amaral enfatizou que o TCE-PR também possui entendimento consolidado no sentido de que a preferência é pela modalidade pregão na sua forma eletrônica, devendo ser devidamente justificada a opção pela forma presencial, conforme expresso no Acórdão n° 2605/18 - Tribunal Pleno, proferido em sede de Consulta com força normativa (Consulta nº 800781/17).

Os conselheiros aprovaram o voto do relator por unanimidade, na Sessão de Plenário Virtual nº 13/25 do Tribunal Pleno do TCE-PR, concluída em 17 de julho. O Acórdão nº 1848/25 - Tribunal Pleno foi disponibilizado em 30 de julho, na edição nº 3.494 do Diário Eletrônico do TCE-PR (DETC)O trânsito em julgado da decisão ocorreu em 8 de agosto.

 

Serviço

Processo :

813342/23

Acórdão nº

1848/25 - Tribunal Pleno

Assunto:

Consulta

Entidade:

Município de Terra Roxa

Relator:

Conselheiro José Durval Mattos do Amaral

 

Autor: Diretoria de Comunicação SocialFonte: TCE/PR

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